Pedro Chagas Freitas – Se a vida te deu uma surra, não aceite um “vai ver que é por uma razão” como consolo.
A vida não é um provérbio bonito. É uma queda real, sem rede e sem moral da história.
Já está nas livrarias o mais recente livro de Pedro Chagas Freitas. O autor, conhecido pelas suas palavras intensas e emotivas, recorreu esta quarta-feira, 24 de julho, ao Instagram para dar um pequeno vislumbre da nova obra aos seus seguidores.
Num excerto partilhado na rede social, deixa antever o tom íntimo e envolvente: “Tudo tem um propósito.” Que embuste de frase. Eis a cobardia lexical por excelência, a almofada suja onde a humanidade vai enfiando as cabeças quando a vida se torna insuportável. Uma frase que quer ser profunda, mas que é só uma desistência elegante. Dizêmo-la para não pensar demasiado. A dor alheia, e até a nossa dor, precisa de ser embrulhada em celofane filosófico. Não queremos que ninguém grite.
Há coisas que não têm propósito nenhum, que não ensinam nada, que não trazem epifanias, que não nos tornam melhores pessoas. Há dores que não são trampolins; são fossas. Há mortes que não salvam ninguém, há tragédias que não iluminam coisa nenhuma. Acreditar no contrário é um insulto a quem sofre.
Dizer que tudo tem um propósito é tão idiota como dizer que uma pedra na cabeça serve para nos lembrar que somos frágeis. Não serve para nada: a pedra partiu o crânio. Pronto. A dor não tem de ser uma lição; pode ser só dor: inútil, injusta.
Há algum tempo que fujo dessas frases. A vida deu-me uma coça e alguém teve a lata de me dizer: “vais ver que isto é por alguma razão”. Não é por razão nenhuma; é só porque às vezes viver é mesmo uma merda. Aprendi a fugir das palavras que querem fazer da merda um perfume.
O meu propósito, se tenho algum, é deixar-me dessas frases ocas, dessas verdades de almanaque. Quero viver com a consciência de que muita coisa não faz sentido. Já não é mau.
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