Ana Rocha de Sousa recebe distinção pelo Prémios Activa Mulheres Inspiradoras 2020 e partilha história de violação, culpa e superação
A cerimónia de entrega dos prémios aconteceu na passada quinta-feira, 27 de maio, no Teatro Tivoli.
Esta iniciativa reconhece o trabalho de figuras de destaque em várias áreas.
Ana Rocha de Sousa surpreendeu todos os presentes e protagonizou um momento marcante no evento com o discurso que fez ao subir ao palco. A atriz revelou que foi violada aos 17 anos.
A atriz começou por dizer que “não existe uma mulher que não tenha tido medo de atravessar um parque escuro à noite, ou qualquer outro sítio mais óbvio de perigo eminente”.
““Existe sempre um momento em que baixamos a guarda”, afirmou. “E, um dia, também eu baixei a guarda e não devia. Culpei-me. Até porque era tão ingénua, própria da tenra idade, que, mesmo avisada com estranheza do perigo, achei ser impossível”, disse ainda.
“Arrependo-me de muito pouco na vida, mas lamento ter guardado a história que tenho cravada por contar. A ti, menina, mulher, adolescente, eu digo: não tens culpa. Lembra-te e repete: não tens culpa. A ti, tenho imenso para dizer que pode ajudar. Escreve, se te fizer algum sentido, o que acabo de contar“.
A atriz deixou algumas palavras aos críticos do movimento contra abusos sexuais #Metoo, que começa a ganhar alguma voz em Portugal.
“Aos inconsequentes que reviram os olhos a estas meninas-mulheres que falam, estas que se chegam à frente, parem imediatamente de se enfadar. Isto não é para brincadeiras. Não são jogos de brincar. Parem já de exigir detalhes a quem, por lei, não os pode revelar. Mais ainda: parem de viver como se alguém no seu perfeito juízo queira ser notícia com isto ou ter o rosto colado a estas dores; a estas tristezas. Saibam que a culpa, a vergonha, nos é imensamente dura e que a última coisa de que precisamos é cobrança, acusação, mais dor ou qualquer réstia de julgamento“.
Num ‘grito’ de coragem, Ana deixa uma mensagem ao seu violador:
“A ti, assediador, violador. Sejas tu um outro, uma patrão, um homem da duna ou um cantor famoso. Fui ensinada a desejar o bem. O bem te desejo. Não pretendo nunca destruir a vida de ninguém. Jamais. Quero acreditar que passados mais de 25 anos és outra pessoa. Esperemos que sejas diferente e muito melhor. Quero acreditar que deixaste de fazer uso da tua fama para assediar e aliciar teenagers para o teu universo sexual, violento, louco e promiscuo. Quero acreditar que fui a única a ser forçada a crescer bruscamente sozinha na vergonha da minha culpa. Que assim tenha sido. Oxalá que assim seja. Repito: nem sou capaz de te desejar mal. Compreendo que só uma alma muito dorida, perdida e atormentada faz o que tu sabes que me fizeste. Ouve bem: nunca mais voltes a fazer. Nunca mais voltes a fazer“.
Podes ver o vídeo aqui.