As bolhas do teu café matinal que podem “prever” erupções vulcânicas: uma descoberta fascinante
Cientistas descobriram que as bolhinhas que aparecem ao mexer o café revelam como se formam bolhas no magma – e isso muda tudo na previsão de vulcões!
Imagina só: estás ali, de manhã, a mexer o café quentinho na chávena, vendo aquelas bolhinhas dançarem à superfície.
Quem diria que esse ritual simples guarda um segredo vulcânico? Pois é, uma equipa de cientistas acabou de ligar o espumoso do teu expresso aos grandes desastres da natureza, numa descoberta que parece saída de um filme de ficção científica – mas é pura ciência, e bem portuguesa no coração.
Tudo começou com um estudo publicado no início do mês na revista Science, liderado por investigadores da Université Clermont Auvergne e da ETH Zurique. Eles pegaram num líquido polimérico aquecido, cheio de dióxido de carbono – tipo um magma em miniatura –, e colocaram-no numa plataforma rotativa dentro de um reómetro, esse aparelho chique que mede o fluxo de coisas viscosas. À medida que aceleravam a rotação, as bolhas surgiam como por encanto nas zonas de maior stress mecânico. “À medida que aumentavam gradualmente a velocidade de rotação, bolhas começaram a surgir nas regiões exteriores, onde o stress de cisalhamento era mais elevado”, explica o relatório do estudo, que revela como o simples movimento pode criar bolhas sem precisar de uma queda de pressão.
E aqui é onde a coisa fica mesmo interessante: isso aplica-se diretamente aos vulcões. Desde os anos 1950 que os vulcanólogos apostam tudo na ideia de que as bolhas no magma nascem principalmente quando a pressão baixa à medida que o magma sobe à superfície,libertando gases como vapor de água e CO2, que formam essas “bombas” gasosas. Mas estes cientistas foram mais longe: mostraram que o “stress de cisalhamento”, ou seja, o atrito que o magma sente ao roçar nas paredes dos condutos subterrâneos ou a contornar rochas, dá energia suficiente para criar bolhas num magma já saturado de gases. É como mexer o champanhe e ver a festa começar, ou, no caso do café, aquelas bolhas que insistem em aparecer quando agitas a chávena.
O que torna isto notável? Um modelo matemático que eles criaram prova que o cisalhamento e a queda de pressão contribuem quase na mesma medida para “acordar” essas bolhas. “Os investigadores desenvolveram um modelo matemático que mostra que o stress de cisalhamento e as alterações de pressão contribuem de forma quase equivalente para superar a barreira energética necessária à nucleação de bolhas”, lê-se no estudo. E as implicações? Enormes.
Mais bolhas significa magma mais leve, que sobe mais rápido, altera a viscosidade e decide se a erupção é um suspiro suave ou uma explosão apocalíptica. Imagina o impacto na previsão de desastres: com isto, poderemos ler melhor as texturas das rochas vulcânicas e estimar a velocidade do magma, salvando vidas num piscar de olhos.
Mas há mais um mistério que esta descoberta ajuda a desvendar: o enigma da obsidiana. Sabes aquelas rochas vulcânicas pretas e brilhantes, como vidro negro? Alguns magmas super viscosos e cheios de gás, em vez de explodirem, fluem calmamente como lava de obsidiana. Como? “A formação eficiente de bolhas por cisalhamento na parte inferior do conduto, seguida do crescimento e coalescência dessas bolhas, pode permitir que estes magmas ricos em voláteis libertem gases antes de atingirem profundidades de fragmentação explosiva”, sugere a investigação. É como se o magma “descarregasse” a tensão lá em baixo, evitando o caos à superfície.
E não param por aí as surpresas. Os cientistas questionam até o papel dos nanólitos, esses cristalinhas minúsculas de óxido de ferro, com menos de um micrómetro, que estudos recentes diziam ser os “sementes” das bolhas. Talvez não sejam tão cruciais; ou quem sabe, formem-se depois das bolhas, e não antes. As experiências usaram polímeros em vez de magma real, mas ajustaram tudo para condições vulcânicas reais: pressões de supersaturação que batem certo com magmas a 2 a 10 quilómetros de profundidade. Perfeito para o nosso Douro vulcânico imaginário.
Fora dos vulcões, isto abre portas para todo o lado. Pensa nos sismos que libertam bolhas de gás, na formação de espuma em plásticos industriais, ou até na expulsão de voláteis em planetas distantes e fontes hidrotermais. É a natureza a mostrar que, por vezes, o que parece pequeno, como uma bolha no café, conecta-se ao grandioso, como uma erupção que muda o mundo.
No fim do dia, esta história lembra-nos como a ciência pode ser poética: o teu café da manhã, com as suas bolhas rebeldes, é um lembrete suave de que o planeta pulsa com a mesma energia imprevisível. Quem sabe, da próxima vez que mexeres a chávena, não estarás a “prever” o teu próprio vulcão interior?