Reclusos por vontade própria, eles fugiram para o meio do nada em 1936 e foram encontrados, totalmente por acaso, só em 1978. Talvez preferissem que nunca ter sido sido descobertos.
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Os geólogos deram conta de que estavam diante de um achado histórico quando o velho Karp Lykov disse que seus filhos, que se comunicavam através de grunhidos, nunca tinham visto um pão na vida. Foi aí que resolveram descobrir qual a história por trás daquela barraca localizada no meio do nada.
Os geólogos estavam numa expedição enviada em 1978 para a Taiga Siberiana, região erma e inabitada da Rússia. Um helicóptero havia sido enviado para a região com a missão de detectar um local seguro para a expedição dos geólogos que chegariam alguns dias depois. Quase por acidente, o helicóptero se viu no meio de um desfiladeiro, com duas imensas montanhas ao lado. Eles não viam traços de civilização em um raio de pelo menos 200 quilômetros – até que uma imensa clareira foi avistada no alto da colina.
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Quando os geólogos finalmente chegaram, a ideia inicial da missão (encontrar ferro e outros tipos de minério) foi colocada de lado e o objetivo passou a ser encontrar explicações para a clareira – um tipo de intervenção inegavelmente humana. Nenhuma autoridade tinha sequer ouvido falar de seres humanos habitando essa parte da Sibéria. Munidos de presentes e armas de fogos, lá foram os geólogos.
“Ao lado de um riacho, tinha uma construção. A cabana estava toda recoberta de detritos da floresta e se não fosse por uma janela minúscula, seria difícil acreditar que tinha gente ali. Eis que a porta abre e um homem, que parecia saído de um conto de fadas, saiu. Descalço, ele usava uma roupa toda remendada e parecia atento e amedrontado. Nós dissemos que viemos visitá-los e, depois de um tempo, com uma voz trêmula, ele disse ‘Bem, já que vocês vieram de tão longe, podem entrar’.” Esse é o depoimento de Galina Pismenskaya, a geóloga russa que chefiou a expedição e a primeira pessoa que conversou com o homem barbudo que abriu a porta. O depoimento foi publicado pela revista americana Smithsonian Magazine.
O chão da cabana era forrado por cascas de batata, pinhas e cascas de nozes. Entre as várias descrições de Pismenskaya para o interior do espaço, fiquemos com “apertado, mofado, indescritivelmente imundo e escorado por vigas caídas”. Além do homem, moravam ali também seus 4 filhos. Foi quando suas duas filhas apareceram, meio sorrateiras, meio desconfiadas, que a cena ficou insondável de verdade: uma rezava, dizendo que aqueles forasteiros estavam ali “por causa dos pecados da família” e a outra parecia verdadeiramente assustada com a luz vinda da janela.
Depois de uma subtil aproximação do velho, ainda naquele dia, os dois grupos começaram a se conhecer. Para resumir a história: ele era um Velho Crente, nome que se deu a uma vertente da Igreja Ortodoxa Russa perseguida pelo Czar Pedro, o Grande. A sua família era de uma fé inviolável e não é difícil imaginar como isso contrastava com o ateísmo dos bolcheviques que tinham assumido o poder em 1917. Em 1936 o seu irmão foi assassinado por uma patrulha comunista. Lykov estava ao seu lado no momento da morte e, assustado, tudo que conseguiu pensar foi em pegar sua família e ir para longe de tudo.
A sua família, na época, era sua mulher e mais dois filhos. Os outros dois – aqueles que nunca viram pão (ou humanos que não fossem da família) na vida, foram concebidos já na floresta. Eles aprenderam a ler com a Bíblia e escreviam com galhos embebidos em seiva de flor. A dieta deles era aflitivamente frágil: em épocas de sorte, batatas e animais eventualmente caçados pela família. Em épocas de azar, folhas e sementes de ervas. Em 1961, durante um verão gelado, a matriarca morreu de fome.
Os geólogos e a família passaram a ter um mínimo de convivência, mas os Lykov se recusavam a sair da floresta. No máximo, uma visita até a base onde os geólogos dormiam. A relação deles com a tecnologia é particularmente curiosa. Primeiro que o velho Karp Lykov (que, por motivos justificáveis, duvidou quando disseram que o homem havia pisado na Lua) disse que já tinha notado a existência de satélites quando chegou a conclusão que “as estrelas estavam se mexendo rápido demais no céu”. A família ficava hipnotizada toda vez que assistia televisão na base, mas logo em seguida começavam a rezar como que percebendo (ou tendo certeza) que tinham acabado de cometer um pecado.
Em 1981, 3 dos 4 filhos morreram – dois com problemas no rim (devido, acredita-se a diferença entre a dieta selvagem e a civilizada) e um de pneumonia. O velho Karp morreu em 1988 e foi enterrado no pé da montanha, ao lado da cabana, com a ajuda de sua filha e dos geólogos. Agafia, a única remanescente, deve estar com seus 70 anos e ainda morava na Sibéria na última vez que os geólogos a viram.